Na coluna anterior, eu procurei apresentar o conceito ESG (Environmental. Social. Governance), dos 17 objetivos de desenvolvimento sustentável da Organização das Nações Unidas (ODS da ONU), contextualizando-o com as condições ideais para escolher uma nova casa. Para tanto, atrelei o conceito ESG à nossa legislação, em especial a Lei Federal n.º 13.146/2015, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (ou Estatuto da Pessoa com Deficiência).
As disposições gerais da Lei Brasileira de Inclusão dão conta de diversas definições relacionadas não somente às pessoas com deficiência, mas também às pessoas com mobilidade reduzida, incluindo idosos, gestantes, lactantes, pessoas com criança de colo e obesos, assegurando e promovendo, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais. Não por acaso, o conceito de mobilidade urbana que adotei está em linha com os demais:
“Mobilidade urbana é a condição criada para que pessoas e bens possam circular pela cidade e exercer atividade econômica e social.”
Condição criada nada mais é que política urbana, política pública, ou governança (Governance, o G da sigla ESG), com o objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes (Art. 182, da Constituição da República Federativa do Brasil). Dentro do conceito ESG, as cidades congregam tanto o Environmental quanto o Social, pois na cidade que se observa com mais vigor as demandas por educação, saúde, alimentação, trabalho, a própria moradia, o transporte, o lazer, previdência social e proteção à maternidade e à infância.
Você deve se recordar que, no ápice da pandemia de Covid-19, a educação sofreu incremento, sobretudo quanto ao ensino à distância (EAD); as consultas médicas incorporaram a em seus protocolos de atendimento a telemedicina; o trabalho teve de se reconfigurar rapidamente para o teletrabalho, com a adoção ou a revisão de diversos contratos de trabalho para contemplar em aditivo o regime telepresencial ou híbrido de trabalho; a moradia teve, de alguma forma, de dar conta dos entregadores, dos couriers, dos motofretistas, dos aplicativos os mais diversos de entrega em domicílio.
O transporte e o lazer sofreram com os impactos econômicos decorrentes das medidas de isolamento social vertical e/ou horizontal adotadas, com teatros e cinemas fechados ou restritos à circulação do público; e a previdência social também sofreu os impactos da pandemia de Covid-19 com a pressão das suspensões, interrupções e demissões. Aliás, em relação ao direito social ao transporte, durante a pandemia de Covid-19 circular pela cidade foi um dos maiores desafios.
O transporte exemplifica bem aquilo que dissemos na coluna anterior, dos três requisitos que nos auxiliam na escolha da nova casa: acessibilidade, intermodalidade e segurança. Acessibilidade é o que qualifica o transporte, relacionando-o a tráfego, trânsito. Intermodalidade leia-se como opção para circular pela cidade, por exemplo, num dia em que seu veículo automotor estiver restrito por causa do rodízio, e você puder/quiser se deslocar de bicicleta, de patinete elétrica, transporte coletivo (ônibus, trem, metrô), táxi ou acionar um motorista por aplicativo. Quanto à segurança, este requisito também é condição criada, política pública, ou de segurança pública, para que pessoas e bens possam circular pela cidade e exercer atividade econômica e social com previsibilidade.
Vamos ao ponto:
Conheço caso envolvendo surfista, em que havia a discussão de se acomodar ou não as pranchas de surfe em vaga de estacionamento de condomínio, ocasião em que o surfista resolveu o conflito com o síndico adquirindo a carcaça de um veículo automotor somente para que pudesse colocar as duas pranchas no capô. O surfista se valeu da literalidade da regra condominial para manter as suas pranchas no estacionamento. Até hoje uso o exemplo do surfista para orientar condôminos e condomínios que ainda não dispõem de bicicletários, ou que não sabem se lugar da bike é no estacionamento, no depósito ou na unidade condominial.
Convido você a participar da coluna, nos comentários, contando como você percebe esses três requisitos na sua casa ou em seu prédio ou condomínio. É de fácil acesso entregar uma encomenda, uma pizza, ou sair do bicicletário com a sua bike, patinete elétrica ou skate? Tem rampa, elevador, ou tem que subir desmontado, carregando a bike nas costas? O estacionamento, a sua garagem, como é? Já possui aquela tomada de três pontas para recarregar a bateria de um veículo elétrico, ou híbrido? Tem depósito, ou é também um depósito?
Voltarei ao tema da acessibilidade, intermodalidade e segurança, e mais causos, na próxima coluna. Até lá!
Thiago Tifaldi é advogado e consultor jurídico, especialista em Direito Constitucional, com ênfase em Direitos e Garantias Fundamentais e mestre em Ciências Sociais, com ênfase em Política.
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