InícioColunasPode haver assédio (moral ou sexual) em home office?

Pode haver assédio (moral ou sexual) em home office?

Essa questão pode até parecer não fazer sentido, pois estamos falando de prestação de serviços fora das dependências do empregador, de maneira preponderante ou não, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação (as tics), o que define o home office, teletrabalho ou trabalho remoto, tal como apresentamos na coluna anterior, conceituação legal que veio no bojo da Reforma Trabalhista, de 2017.

Mas, o que é assédio moral? Assédio moral é expor alguém a situações humilhantes e constrangedoras. Em regra, a exposição ocorre de maneira repetitiva e prolongada, mas pode haver casos em que a humilhação e o constrangimento ocorram uma única vez com grande intensidade danosa. São exemplos:

xingamentos, agressões verbais, comunicação violenta. No home office, enviar mensagem ou gravar áudio com xingamentos, agressões verbais, emojis desabonadores, caixa alta, gritar no áudio; em grupo, individualmente, ou em reunião por videoconferência. A ausência total de comunicação também pode configurar assédio moral e ser tão violenta quanto a ação: não responder intencionalmente uma pergunta, interromper constantemente a fala de outrem numa reunião por videoconferência. No limite, além de se configurar assédio moral, a depender da situação, pode extrapolar a esfera trabalhista e resvalar em crime contra a honra (injúria, calúnia ou difamação).

imposição de metas abusivas ou impossíveis de se atingir. No home office, essa situação começa a ficar mais perceptível em jornadas de trabalho exaustivas, sobretudo quando a flexibilidade de horário é utilizada pelo empregador em desfavor do empregado, impactando na existência digna da pessoa. Essa prática, infelizmente, se tornou algo comum em determinadas empresas de telemarketing ativo durante a pandemia de covid-19. Para o atingimento de meta diária não é raro que você receba uma ligação telefônica, mensagem (e-mail ou rede social) ou áudio após o horário comercial. Se impacta em sua vida, em seu horário de lazer ou em sua atividade física, imagine do outro lado!?

acusação por um erro inexistente. No home office, como a prestação de serviço ocorre fora das dependências do empregador, as avaliações de desempenho e feedbacks acabam ficando em segundo plano, ou são solapadas pela sobrecarga de trabalho, ou por jornadas exaustivas que podem forçar o erro ou forçar o empregado a pedir demissão.

ausência de instrução adequada. No home office, a depender da forma de contratação, por tarefa ou demanda, além de discriminar o recurso externo de recurso interno, essa prática pode impactar nas outras modalidades de assédio moral, enunciadas acima. Recentemente, veio à tona que uma das possíveis concausas para a queda de avião com mais de duzentas pessoas à bordo, em 2009, foi ausência de treinamento adequado para uso de tecnologia de aferição de velocidade e de condições climáticas.

brincadeiras ofensivas e constrangedoras. No home office, isso também pode vir a ocorrer, do empregador para o empregado, ou ainda, de empregado a empregado, com o uso das tecnologias de informação e comunicação. Em vendas, essas situações humilhantes e constrangedoras oferecem diversos exemplos. Aproveito o exemplo pra te dizer o assédio moral pode ser vertical, da chefia ou coordenação; horizontal, ou seja, em mesma hierarquia, sem repreensão pela chefia; ou misto, tanto da chefia quanto dos colegas de trabalho.

Ok, mas e quanto ao assédio sexual em home office? Assédio sexual caracteriza-se pela ameaça, agressão ou ameaça de agressão ou hostilidade contra subordinado (homem ou mulher), objetivando algum favor de cunho sexual em troca de promoção ou de premiação. É bem sútil, mas a exigência de comparecimento reiterado nas dependências da empresa, ou a insistência para que a câmera permaneça aberta em reuniões de videoconferência sem que haja necessidade, podem configurar assédio sexual.

A menção à vestimenta, se decotada ou não, durante videochamada pode encerrar uma mensagem de cunho sexista tanto pelos colegas quanto pelo empregador, chefia, coordenação ou liderança. Sabe aquela recomendação aparentemente ingênua para que, na próxima reunião de alinhamento ou videoconferência, a pessoa volte a usar aquela mesma roupa ou vestimenta, decotada ou com outro adorno!? Há ainda casos mais graves, em que se exige que a pessoa use determinada vestimenta, mesmo trabalhando de casa. Atenção!

E, por último, mas não menos importante. Observe se a exaustão, a desmotivação, o esgotamento físico e mental, a impaciência, a irritabilidade, a insatisfação, a sobrecarga, o isolamento, a apatia e a fadiga, fazem parte da sua rotina não somente de trabalho, mas do seu cotidiano, impactando até em seus relacionamentos.

Além de ser dano existencial, as situações acima exemplificadas afastam a pessoa tanto do convívio familiar quanto social, e podem configurar o burnout, ou síndrome do burnout.Lembra-se do caso de uma apresentadora de telejornal nacional de canal de televisão aberta que não conseguiu informar a previsão do tempo em telejornal por causa do esgotamento mental da sobrecarga!? Que ficou paralisada, e não conseguia pronunciar corretamente o nome do Estado de origem dela no mapa do Brasil!?

Nesse caso, não se automedique, nem busque a solução destes problemas (apenas) numa lata de energético. Procure auxílio médico especializado e busque orientação jurídica adequada: um ambiente de trabalho seguro e saudável é um direito fundamental! Esta coluna adere ao dia 28 de abril, data escolhida pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) para celebrar o Dia Mundial da Segurança e Saúde no Trabalho.

Thiago Tifaldi é advogado e consultor jurídico, especialista em Direito Constitucional, com ênfase em Direitos e Garantias Fundamentais e mestre em Ciências Sociais, com ênfase em Política.

Contato: thiagotifaldi@adv.oabsp.org.br

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